domingo, 5 de agosto de 2007

A Espiritualidade das Catacumbas


(3ª parte)

Espiritualidade social

A espiritualidade das catacumbas é também "social": o cristão habituado a dizer na oração não mais "Meu Pai", mas "Pai nosso", sabe que na família de Deus não se vive de modo isolado, mas socialmente: "Sendo muitos, somos um só corpo em Cristo" (Rm 12,5). As catacumbas dão-nos a imagem desse corpo místico no qual os cristãos ordinariamente convivem em hierarquia de funções e em unidade de espírito. Aqui os Pontífices Mártires repousam em meio à humilde multidão do seu rebanho.

Da parte frontal de um sarcófago, um jovenzinho eleva as mãos em atitude de orante bem-aventurado na visão de Deus: aos seus lados, parece que Pedro e Paulo, os fundadores da Igreja de Roma, o introduzem na pátria beata.

Em Domitila, na pintura de um arcossólio, Veneranda chega com roupas de viagem, peregrina que concluiu o seu exílio, às portas da pátria: a santa do lugar, Petronília, com aspecto suave, a acolhe e faz entrar.Há um intercâmbio de orações entre as diversas partes da Igreja! Centenas de peregrinos recomendam-se a Pedro e Paulo sepultados na Memória da Via Appia Antiga (Catacumbas de São Sebastião), gravando breves mensagens na argamassa da tríclia (ambiente para banquetes funerários, a céu aberto): "Paulo e Pedro, orai por Vítor - Pedro e Paulo, tende Sozomeno no pensamento".
No ingresso do mausoléu dos Papas em São Calisto, a parede está constelada de orações: "S. Sisto, tem Aurélio Repentino no pensamento", "Espíritos Santos... que Verecundo bem navegue com os seus". Às vezes não há uma oração explícita: basta, para implorar, uma qualificação acrescentada ao nome: "Felicião, sacerdote, pecador".Contam-se aos milhares as inscrições com orações dos vivos pelos defuntos ou com solicitações aos mortos para que rezem pelos que estão vivos. Na sociabilidade do Corpo Místico, cada indivíduo está ligado à Igreja inteira.

Espiritualidade Escatológica

O cristão tende aos "éscata", isto é, às realidades definitivas da vida eterna: "Não temos aqui em baixo morada permanente, mas estamos em busca da morada futura" (Hb 13,14). "A nossa pátria é nos céus" (Fl 3,20). Basta um breve giro por uma catacumba para ver essa verdade brilhar da mais viva luz. E chegamos à escada que desce à Cripta dos Papas (foto acima). Na parede esquerda uma lápide fala-nos de Agripina, "cuius dies inluxit": o dia da morte foi o dia do seu ingresso na luz, na esperada bem-aventurança. Pouco abaixo uma inscrição grega de Adas, que "ecoimète", "adormeceu", como a menina de Cafarnaúm, que - como diz o Evangelho - "não está morta, mas dorme" (Mc 3,59), e espera a chamada d'Aquele que é a ressurreição e a vida.Numa capela, Jonas, que escapara das garras do monstro representante da morte, repousa placidamente à sombra de um caramanchão. Mais além, o Bom Pastor aperta com ternura o cordeiro nos ombros: a morte não é mais terrificante para o cristão, que é levado por Jesus a verdes pastagens.
Da parede de um cubículo cinco cristãos elevam os braços em ato de adoração; ao redor deles um belíssimo jardim florido: é o paradisus, o jardim celeste. De uma lápide, entre as mais antigas, uma cruz-âncora anuncia-nos que chegou ao porto do paraíso uma cristã que tem um luminoso nome de estrela: "Hèsperos".Estes cemitérios são, também, cheios de paz. A resposta está na fé dos antigos cristãos, que freqüentemente fala no silêncio das catacumbas: "Porque procurais entre os mortos aquele que está vivo?" (Lc 24,5). "Eu sou a ressurreição e a vida" (Jo 11,25). "Não tenhas medo, somente fé" (Mc 5,36).
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